domingo, 9 de novembro de 2014

Manual da despoesia

Depois de escrever um poema, experimente fazer o movimento contrário.

Primeiro, arranque-lhe a forma: retire os versos ornamentados, as métricas impecáveis, as rimas prontas, o ritmo cadenciado. Anule os métodos e procedimentos de construção. Deixe-o desritmado, desintegrado. Emudeça a sonorização.

Em seguida, arranque-lhe a poesia. Retire a linguagem poética e metafórica. Desfaça sentidos, conceitos e símbolos. Decomponha as entrelinhas, o excesso, as implicaturas.

Deixe que as palavras respirem, vazias e nuas.

Liberte-as de ideologias, formatos e propósitos. Enterre suas máscaras e múltiplas semânticas.

Des-cubra valores éticos e estéticos. Procure manter a face pura e neutra.

Obtenha, assim, o princípio e a essência da criação. Inspire-se no silêncio, no inverso do pensamento.

Alimente-se da não poesia

E comece tudo outra vez.



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